As vezes um bom filme surge de uma história simples, uma família pobre que possui uma casa há várias gerações tem que enfrentar um prefeito corrupto que deseja transformar o local num lugar que irá beneficiar seu bolso e o de diversos empresários. Familiar até demais não? Lembrando muito ao filme "O Milagre Veio do Espaço" (*Batteries Not Included, 1987) de Matthew Robbins, que conta a história de uma velha casa que é ameaçada por grandes empresários. Fica difícil não lembrar algo que um amigo sempre me diz, o que faz de um filme ser bom é a maneira que é contada a história, não sua inovação. Talvez "Psicose" (1960), "Clube da Luta" (1999), "Eu, Eu Mesmo e Irene" (2000), "Janela Secreta" (2004) e "Ilha do Medo" (2010) tenham muito em comum, todos contam a história de uma
pessoa lutando contra si mesmo, seu outro lado oculto, NÃO?
+ "Leviatã" (Левиафан, 2014) de Andrey Zvyagintsev
+ "Leviatã" (Левиафан, 2014) de Andrey Zvyagintsev
Mas para falar de Leviatã é preciso ir além de simples comparações, ao desenvolver sua narrativa nos chocamos com acontecimentos até então impensáveis, que mexem com nossa mente, nos deixando ao final quase sem fé... "Afinal quem governa o mundo dito democrático?"
Para enfrentar um prefeito corrupto (Roman Madyanov) Kolya (Aleksey Serebryakov) chama seu antigo amigo Dmitriy Seleznyov (Vladimir Vdovichenkov), que hoje é um excelente advogado, e assim, o filme começa a destilar sua crítica... No meio dessa Rússia, dita hoje democrática, com direitos iguais para todos... Dmitriy só encontra empecilhos para defender legalmente seu amigo. Em que vemos que nada funciona realmente, mostrando uma Rússia com todos seus estabelecimentos democráticos vazios, parecendo que estão totalmente falidos... Dmitriy parte para um caminho fora da justiça, a chantagem, e assim consegue melhorar o panorama do caso. Vemos então um país, no caso a Rússia, que possui pouquíssima experiência democrática, já que ainda resiste aos resquícios do autoritarismo da União Soviética, se encontrando totalmente fálida na efetiva participação popular. A ÚNICA COISA QUE FUNCIONA? A corrupção! (Mas calma! Nada de dancinha na Av Paulista com a camiseta da seleção brasileira)
Corrupção, que é o único caminho encontrado por Dmitriy para auxiliar o amigo, mas a partir dai não encontramos isso somente na esfera política... Kolya costuma realizar alguns trabalhos para amigos policiais, sendo que seu melhor amigo, também policial, não demonstra em nenhum momento do filme alguma atitude de justiça ou de segurança. Mesmo sendo algo tão moral e simplista, a corrupção é apresentada como um mal, mal que se faz presente em qualquer personagem do filme. O filho de Kolya, Roman (Sergey Pokhodaev) tem um forte ódio para sua madrasta Lilya (Elena Lyadova)... Lilya tem um caso com o advogado Dmitriy... e assim vai o filme (não quero dar mais spoiler...)
Assim a "corrupção"/"o mal" não está "lá" ou "no outro", mas sim em todos nós, mesmo fazendo uma forte crítica a política russa, o filme consegue fazer um grande panorama de como nos encontramos hoje. Que democracia é essa, que é defendida até por meio de guerras, sendo que na prática não existe? O problema estão nos governantes? Ou é de todo ser humano?
Verdades? Esse filme RI NA CARA DA VERDADE, meu velho! Expõe de maneira bem caricatural a instituição Igreja, mostrando como são idiotas os valores defendidos, sendo que suas atitudes são totalmente o oposto, tanto dos padres como dos fiéis. As conversas entre o prefeito e o padre são sensacionais! São precisas ao mostrar as diversas contradições do amor pregado pela Igreja e suas ações... Numa cena rápida vemos uma evidente contradição: ao mesmo tempo que vemos três imagens de santos, conseguimos ver três imagens de mulheres nuas...
O pensador Thomas Hobbes |
Talvez essa seja a BRISA MASTER do filme, mostrar que somos seres contraditórios, nossa vida não é o bem contra o mal, mas sim de seres contraditórios com seres cheios de incertezas... O final do filme é um dos mais amargos que vi no cinema, aquele gosto ruim na boca que até tive que tomar uma bebida doce após a sessão (Acaí sempre presente nos roles!), mas é como outro amigo me dizia, um filme feliz nos faz acreditar que o mundo é perfeito, com isso não há nada mais o que fazer, já um filme triste mostra o quanto precisamos melhorar... Se for por isso, Zvyagintsev fez esse filme na intenção de transformar o mundo por completo!
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